Os Jogos Olímpicos da Antiguidade contaram, por quase doze séculos (entre 776 a.C. e o século IV d.C.), com a chamada trégua olímpica (Ekecheiria), ou seja, três meses antes, e até três meses depois do período de competições, os conflitos entre as cidades-estado gregas eram interrompidos para que atletas e espectadores pudessem chegar e sair em segurança da cidade de Olímpia. Já em tempos atuais, em pleno ano de 2022, temos notícias de atletas pegando em armas e, inclusive, sendo abatidos em uma guerra, que teve início apenas quatro dias após o encerramento dos Jogos de Inverno de Pequim. Mas até chegarmos aqui, temos uma longa história dos esportes entre guerras e conflitos.
De uma forma resumida, podemos começar relembrando que os Jogos Modernos não ocorreram em três ocasiões (1916, 1940 e 1944) devido às grandes guerras mundiais. Depois disso, houve o massacre nos Jogos de Munique, em 1972, em que terroristas invadiram a Vila Olímpica e fizeram reféns atletas e técnicos de Israel, exigindo a libertação de duzentos palestinos presos em terras israelenses e um avião para fuga. Houve uma ação sem sucesso da polícia, que resultou em 11 reféns, um policial e 5 sequestradores mortos.
Em sinal de protesto à invasão do Egito pela França, Inglaterra e a antiga União Soviética (URSS), Líbano, Egito e Iraque se negaram a participar dos Jogos Olímpicos de Melbourne, em 1956, assim como Espanha, Holanda e Suíça não compareceram à edição devido à invasão da Hungria pela URSS. A rivalidade entre URSS e Estados Unidos durante a Guerra Fria (1947–1991) influenciou uma série de boicotes aos Jogos em 1980 (Moscou) e 1984 (Los Angeles) — algumas das tensões ocorreram em razão dos conflitos no Vietnã, na Coreia e no Afeganistão. Em 1988, a Coreia do Norte boicotou os Jogos de Seul por causa dos conflitos com a Coreia do Sul. Alguns países, como Nicarágua, Madagascar, Etiópia e Cuba acompanharam o boicote, enquanto Seychelles e Albânia não enviaram seus atletas, mas também não confirmaram o boicote por receio de receberem sanções.
A partir de 1991, houve uma série de embargos e sanções contra o governo iugoslavo devido aos seus crimes de guerra. A proibição à participação da Iugoslávia em competições esportivas era uma das medidas, e o país acabou sendo banido da Eurocopa e dos Jogos Olímpicos de 1992 em Barcelona. No entanto, o Comitê Olímpico Internacional permitiu que os atletas classificados participassem das competições daquele ano representando a bandeira dos “Participantes Olímpicos Independentes”.
Um pouco antes do início dos Jogos de Inverno de 2018 na Coreia do Sul, as tensões entre Estados Unidos e Coreia do Norte se intensificaram, o que colocou em xeque a participação dos atletas norte-coreanos na competição. Houve um acordo temporário entre as partes envolvidas no conflito, e os atletas puderam competir.
Em 24 de fevereiro de 2022, teve início a guerra entre Rússia e Ucrânia, que vem gerando impactos políticos, econômicos e humanitários enormes para esses povos (e para todo o mundo), e, no que se refere aos esportes, pudemos ver uma mobilização declarada de atletas e ex-atletas ucranianos de diversas modalidades, não só em seus posicionamentos sobre o conflito, mas disponibilizando-se para o combate armado contra as tropas russas para defender suas famílias e seu país.
Muitos deles têm aparecido em suas redes sociais vestindo uniformes militares e portando armas, desistindo de participar de competições devido à guerra. Infelizmente, já tivemos tristes notícias sobre atletas mortos em combate. Alguns, que decidiram seguir nas competições, estão doando os prêmios recebidos para o exército ucraniano e para a distribuição de mantimentos à população. Outros estão arrecadando dinheiro, como os atletas da seleção masculina de futebol.
Do outro lado, muitos atletas russos se declaram contra a guerra e, mesmo assim, estão sendo banidos das diversas competições que estão acontecendo ao longo de 2022, como os Jogos Paralímpicos de Inverno, em Pequim. Eles puderam participar do evento com uniformes e bandeira neutras, sem menções ao país e suas cores, sob o título de Comitê Olímpico Russo. Segundo algumas instituições, esse banimento não é uma punição, mas, sim, uma forma de apoio a um acordo de paz entre os países em conflito. Também há manifestações a favor de Putin, como alguns atletas russos da natação e do hóquei no gelo, entre outros que se rebelam por não poderem utilizar as cores e bandeira de seu país, enquanto ucranianos podem.
De maneira inevitável, o esporte é atingido nesse tipo de situação, mas é o menor dos problemas em meio a esse tema tão sensível. Fica a reflexão sobre como será difícil para as populações ucraniana e russa (e mundial), e os esportes incluídos, retomarem suas vidas após o fim da guerra.(*) Katiuscia Mello Figuerôa é doutora em Ciências da Atividade Física e Desportiva, professora da área de Linguagens Cultural e Corporal nos cursos de Licenciatura e de Bacharelado em Educação Física do Centro Universitário Internacional Uninter.
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