O esporte sempre fez parte da vida de Rafael Marques. Nadador, com apenas oito anos fez sua primeira travessia no mar. Depois vieram a bicicleta e a corrida. Já adulto, e triatleta, o caminho natural o levava para o Ironman. Mas um grave acidente fez com que seus planos fossem adiados. E por muito pouco, quase encerrados. O ano era 2010, e o economista carioca havia acabado de se inscrever para a edição de Florianópolis do ano seguinte. No primeiro treino na estrada, ele iria pedalar 120km. Cento e dez já tinham sido percorridos, quando um caminhoneiro que dormira ao volante saiu da pista e o atingiu em cheio. Rafael passou uma semana na UTI, ficou três meses internado, perdeu 60% da vista direita, teve 15 fraturas pelo corpo e uma exposta, teve de fazer enxerto, além de colocar uma haste na perna direita. Tempos difíceis. Que deixaram marcas eternas, traumas, mas lhe deram ainda mais garra, determinação e vontade de lutar.
Apenas um ano após o ocorrido, Rafael retomou aos poucos sua rotina de treinos. No início, caminhava e dava trotes leves. Mas ainda sentia muita dor. Nunca mais voltou para a estrada.
– Ficou um trauma. Então eu treinava indoor, spinning, rolo e academia especializada em bike indoor. O único treino de rua era de madrugada, no Aterro do Flamengo, na área fechada para ciclistas – contou.
E em 2014 Rafael conseguiu engatar uma sequência boa de treinos e voltou a fazer provas de triatlo. No ano passado decidiu que era hora de se inscrever de novo no Ironman Florianópolis e resgatar o antigo plano. Mas às vésperas da tão esperada prova, mais um problema apareceu para ameaçar o sonho do economista. Um dia ele acordou com 41º de febre, muitas dores nas articulações e foi parar na emergência de um hospital.
– O primeiro diagnóstico era suspeita de chikungunya. Na terça, continuei com febre muita alta. Depois voltei ao hospital e se dissipou essa suspeita. Ficou entre virose e zika. Os médicos falaram para eu não fazer a prova. Viajei sem saber se iria fazer. Levei tudo e fiquei de decidir até sábado à noite. Dependendo de como me sentiria no dia.
E a dúvida persistiu até a hora H. Rafael estava no meio de um processo infeccioso, mas resolveu encarar o Ironman mesmo assim. Para quem já havia superado um caminhão e meses de cirurgias e hospitais, o que seria uma febrezinha?
– Fui para a largada, e deu tudo certo. Durante a prova fui superconservador. Fiz uma natação tranquila, sem me esforçar muito. Fiz uma bike sem passar dos limites e a corrida foi superboa também. Não senti dor, e deu tudo certo. Tentei aproveitar o máximo da prova, curtir a paisagem. Em nenhum momento foi um sofrimento para mim. Estava em êxtase. Deixei para pensar na corrida só no momento da corrida. Foi tudo muito tranquilo. Não me preocupei com performance. Só queria completar a prova e foi assim até o final. Curti a prova a cada momento. Foram 14 horas. Meu primeiro Ironman! – comemorou.
E depois de 14h22m39s, o sonho de Rafael Marques, que começou lá atrás, antes do acidente que mudou sua forma de enxergar a vida, pôde enfim ser realizado. E com louvor. Ao passar pelo portal de chegada, passou um filme por sua cabeça, e não foi possível controlar as lágrimas.
– Nem nos meus melhores sonhos eu imaginei que seria tão emocionante. Foi duro, mas foi mágico. Foi sacrificante, mas foi especial. Tudo o que aconteceu só veio para me dar mais força para continuar, porque eu sabia que era capaz. Veio um filme na minha cabeça. Pensei nas pessoas que me ajudaram desde o início…
E ironman que é ironman já sai da prova pensando na próxima. Com Rafael não foi diferente.
– Penso em fazer outros. Gostei muito da experiência. Quero voltar com certeza!
Fonte: euatleta